sexta-feira, 30 de agosto de 2013

Continuação: O HOMEM QUE FOI UM CLAMOR

Fernando Teixeira e  Guillaume Thieriot

UM ILUSTRE DESCONHECIDO

Como Gui di Bolama já falou dos brasões familiares do Guillaume Thieriot, resta-me voltar as palavras dele, agradecendo a nossa presença e o gesto em sua honra. Pois foi neste dia que fiquei a conhecer um pouco mais do percurso de vida deste cavaleiro. Durante a sua emotiva intervenção, Guillaume Thieriot acabou descerrando um pouco o véu sobre a sua vida privada (origens familiares) e profissional, e como veio a chegar a esta martirizada terra.

Nesse momento compreendi que pouca coisa conhecia da vida pessoal, para não dizer privada, deste homem afável e pausado. Mas como ele não é meu amigo isso era normal. nunca tomamos um copo juntos ou coincidido sair numa campainha comum, embora Bissau seja muito pequeno. Nem o número do telemóvel dele alguma vez tive no meu.

Nunca o conheci na intimidade, salvo uma vez, que o vi sentado no “café” Benfica, rodeado da esposa e os dois filhos, que vieram de visita, creio. Pela proximidade e exiguidade do espaço, mais do que pela educação, não pôde deixar de o cumprimentar (e já agora, não me apresentou a esposa, pois como disse, não eramos amigos. Mas como disse , não eramos amigos, nem sei se alguma vez fomos camaradas (“Cau pera sabura pa kunsi camarada. Sabura sucuro pa cunsi camarada”, bu lembra Guilherme?).

Friso isto por ser verdade e por uma outra razão; temos que começar a ser criteriosos no uso das palavras; toda gente, aqui, diz que ele era um amigo e vice versa. Discursam dizendo “o meu amigo Gui” e depois, isto ou aquilo. E muitas vezes esse tratamento não correspondia manifestamente a verdade).

Mas gostaria de ter sido seu amigo e o digo isto aqui sem nenhum pudor (se devemos ser rigorosos com as palavras, muito mais com os sentimentos) pois raramente em minha vida “quis”, conscientemente, “ser amigo” de alguém. Por isso possivelmente este texto é escrito também desta maneira como o escrevi, com algum sentimentalismo, mas sem vergonha do mesmo, pois como o G. K. Chesterton disse há tantos e tantos anos atrás, "O miserável receio de ser sentimental é o mais vil de todos os receios modernos." Por isso que Deus me ajude de não albergar esse “miserável” sentimento na minha alma quando falo deste outro senhor.

Mas “não ser amigo” é apenas uma condição necessária, mas não determinante, para o que dizemos. Quando digo que não somos amigos, quero que também entendam que por essa razão não o conheço, tudo o que viu, fez e ou mudou nesta terra. Por isso pouco posso dizer, mas mesmo assim, ainda há algo a dizer por mim. Assim, deste “não amigo”, deste “ilustre desconhecido”, qual um Cyrano de Bergerac Guineense, posso falar com tranquilidade e distanciamento.

Entendi algures que ele não quereria mais uma homenagem depois de tantas que lhe foram prestadas, mas realizações. Ou diria que a homenagem que mais lhe agradaria seria a realização dos seus sonhos para nós que são tão grandiosos como simples: “(…) se acreditarem na sua língua, na sua cultura, em vocês mesmos, poderão fazer coisas maiores (…)”

Daqui parto para essa dimensão mais humana dele. Como disse não quereria que dele falasse, elogia-se e dissesse coisas bonitas, por mais merecidas que fossem, apenas por dizer. Mas aqui, através do Guillaume, devo falar de uma outra dimensão, a dimensão dos que ele influenciou consciente ou inconscientemente. Como exemplo dou o de um grupo musical Guineense (da qual nunca tinha ouvido antes falar sequer), chamado estranhamente de “Exercito de Já”, que irrompeu pelo palco do Centro Cultural sexta passado a cantar música Reggae.

O vocalista, uma cópia jovem do grande Bob Marley, mas com todos os maneirismos deste, brindou-nos no fim com umas eloquentes palavras em inglês, português, crioulo (e uma tentativa pouco conseguida em Francês); basicamente disse que agradecia ao Guillaume por ter sido o primeiro que neles confiou neste país e o primeiro a lhes dar uma oportunidade de poderem apresentar-se ao publico tocando a sua música. O primeiro a acreditar neles (podia ter sido o último em não acreditar, ou mais um apenas, que não acreditou)? Aceitam que para estes jovens esta dimensão é diferente de tudo a que estão habituados neste país? Bem, falei destes, que conheci, mas quantos outros haverá que só Guilherme conhecerá porventura? E porque ele e não nós?

Entendo que a “mudança de pensamento” na direção de valorização da cultura, nunca deve ser um fim em si, mas apenas um caminho para a valorização de homens como um todo, como um “conjunto de homens” unidos por um destino comum, que muitos teimam em não ver. . Em outro lugar afirmei que “não se salva um povo pela economia, mas pela cultura” , querendo com isso dizer que se a economia é a base sem a qual nada é sustentável, a cultura é a superstrutura sem a qual não existe e não existirá a nação.

 II
Há frente vos falarei da cidade de Moscovo e a sua ligação (!) com Guillaume Thieriot, através de mim; ou a minha ligação com essa cidade através dele; Já nem sei a quaantasando, mas por agora quero vos contar uma pequena história que veio dar o título a este texto. Pouco depois de ter concluído a faculdade, um dia em Moscovo, tendo levado a minha esposa e filha ao aeroporto de Sheremetievo a fim de viajarem para Lisboa, na volta conheço um velho latino americano, que já vivia há muitos anos em Moscovo. Como o metro é tão grande como essa cidade de 12 milhões de habitantes, demoramos quase uma hora a chegar ao centro. Pelo caminho falamos de muita coisa, desde Mayakovski ao Balet Russos, passando pelas lutas de libertação, Cuba, Angola, perestroika (que estava no seu auge), Gorbatchov e de outras coisas também importantes, como da beleza das mulheres.

Moscovo é uma cidade de mulheres bonitas que entram e saem das carruagens do metro numa profusão tal que era impossível apreciar cada uma delas mais do que três minutos inteiros. Na altura, capital de um gigantesco estado multinacional e transcontinental, nessa cidade havia todos os tipos de mulheres que existiam neste mundo; desde caucasianas, asiáticas, orientais, indianas, chinesas, mongolianas, e de todas as variações possíveis dentro desses grandes grupos. Loiras, ruivas e morenas (todas as tonalidades imagináveis de loiro, ruivo e moreno) de olhos azuis, verdes, negros, e tantas outras impossíveis de quantificar.

Era tanta beleza em cada carruagem que era impossível catalogar. A tentação de olhar para todas, de por um minuto ter nos nossos olhos essas maravilhas da natureza, era grande, mas os olhos eram apenas dois e de nenhuma maneira era possível. Abatido pelo cansaço, acabei desistindo , e o velho que apreciava os meus olhares, enquanto respondia as suas perguntas, disse meio sério, meio a brincar, algo que até agora não esqueci, embora que passados vinte anos: “Fernando, no se puede tener a todas las mujeres del mundo, pero tenemos que hacer lo posible”, ou qualquer coisa de muito semelhante; isso me fez rir tanto, como ainda rio agora ao relembrar. Mas só conto isto, porque com apenas quinze anos, sem ainda conhecer nem Dacar e muito menos Moscovo, resolvi ler toda a biblioteca nacional, em apenas três meses (férias grandes).

Nessa altura, depois da minha frustrada tentativa (também abatido pelo cansaço, decepcionado comigo mesmo, quando as ferias findaram), continuei com a minha decisão; mesmo no período escolar sempre que podia a ir a essa biblioteca. Embora já tinha percebido que a decisão tomada era irrealizável. Mas a analogia que encontrei entre as duas situações me fez pensar que então, a dificuldade já era a mesma, por isso a decisão, embora inconsciente, deveria ter sido igual: “não se pode ler todos os livros do mundo mas devemos fazer os possíveis”.

Mas nem tudo foi perdido, nessa minha tentativa, pois conheci escritores que nem imaginava existirem. Mas para este texto só falarei de um que tinha escrito livros com títulos estranhos, como “O HOMEM QUE ERA QUINTA FEIRA”, “NAPOLEAO DE NOTINGHAM HILL “, e outros tão estranhos como estes; chamava-se Gilbert Keith Chesterton. É inspirado nele que vou buscar o meu título para este texto e uma descrição para o meu homenageado: O HOMEM QUE ERA UM CLAMOR.

Assim chamei Guillaume de “Um Clamor”; de facto foi um clamor na noite escura da cultura Guineense. Pois um clamor mais que uma luz, chega a todos. Uma luz só é vista por quem olha em sua direcção, mas um clamor é espalha-se por todas as direcções; acorda-nos mesmo se estivermos a dormir. Sendo como ele, um homem temerário nas palavras, chamo-o como deve ser chamado. Que dizer mais dele? Ou por outro, o que não deve ser dito, o que é pouco relevante, o que pode ser deixado de lado da vasta obra do Sr. Thieriot? Se não estamos a escrever uma biografia , como medir a importância deste vulto para o nosso país? Desse que se orgulha de nós, as vezes mais do que nós próprios? Nas suas emotivas palavras 
“N’ta sinti orgulhu kada bias ki n’tene ki fala di Guiné Bissau la fora.”

Eu sinto orgulho de ouvir você dizer que sente orgulho de nós Guillaume, porque sei que é desinteressado, é apenas, produto da amizade e vivência comum. Prevejo que esta vivencia venha a dar frutos e coroar mudanças que já despoletou, prevejo profundas mudanças na nossa maneira de relacionar-mos com a nossa cultura.

quarta-feira, 21 de agosto de 2013

Continuação...Gui de Bolama

Arq. Fernando Teixeira

GUI DE BOLAMA, GUILLAUME DE BISSAU, DIRECTOR THIERIOT E UM CERTO GUILHERME, QUATRO HETERÓNIMOS DE UMA EXISTÊNCIA

Duas semanas antes do “dia da compulsão”, fui assistir a festa de despedida de Guillaume Thieriot feita por artistas Guineenses. Foi, creio, a melhor de todas; uma profusão de cores, grupos de “mandjuandade”, de teatro, actuações de dezenas de músicos e cantores, leitura de poesia, cocktail, discursos, danças, etc, etc. Esta era a segunda despedida dele que assistia, entre tantas outras que foram feitas em sua honra. Mas desta falarei a frente, por agora, pela pressa e método este, de “ir devagar”, falarei da primeira que assisti na Embaixada francesa, feita, portanto, pelos seus compatriotas franceses e colegas diplomatas.

Num sóbrio cocktail, o discurso do (Embaixador) Encarregado de Negócios, também foi sóbrio, embora simpático e elevado, como é de praxe nestas cerimónias. Mas o que me leva a esse dia é o inusitado (pela forma e conteúdo) discurso de agradecimento do homenageado, a que já fiz referência, uma verdadeira peça de oratória, da altura de um Rui Barbosa (seu também compatriota). Mas o importante para mim, foi que nesse discurso de agradecimento encontrei o cerne do seu pensamento no que tange a Guiné. Um agradecimento que agradece e retribui num desprendimento de alma que levanta um pouco o véu sobre a seu pensar, a sua concepção do mundo em que vive, e particularmente sobre este mundo guineense, crioulo, que em breve deixará.

Mas como este texto não é uma pequena biografia mas a tentativa de dar um vislumbre do seu pensamento sobre nós, resolvi que quero ir para além do que o que ele próprio disse, sobre si (e sobre nós), nesse seu “discurso do método” (do de se ser um homem digno), de despedida. Por isso, embora este texto não seja um “texto sobre outro texto”, esse discurso vai-me ajudar a explicar o “director” Thieriot , o “pauvrehomme ” Guillaume e o “nosso compatriota” Gui de Bolama. Mas não só; esse discurso, vai-me permitir falar de nós guineenses, neste particular momento político em que vivemos.

Simples, mas emotivo, foi um discurso onde ressoava não a vacuidade de um conhecimento poliglota enfatuado, mas o respeito pelas línguas em que expressava. Trilingue (plurilingue?), de uma perfeição e beleza notáveis, numa profusão de vocábulos em três idiomas a vez, mas por onde perpassava um sentimento profundo de ligação a esta terra e de genuíno interesse pelos destinos deste povo. Esse magnífico discurso, que dividido em três partes, respeitando assim as regras do discurso, que organiza o texto em três partes principais a saber “apresentação”, “explanação” e “conclusão”, é também outra vez dividido em três partes linguísticas, se assim posso elucidar, pois começa em crioulo e termina em português, separado pelo francês.

Entrando e saindo destas línguas em velocidade de cruzeiro, mas em mudança automática, sem contradições, ligando-as e completando-as numa simbiose de vocábulos e interjeições apreendido por todos, mesmo aqueles que só falavam uma das línguas. Por agora vamos ouvir o director Thieriot que nos leva a um passeio pelas suas reminiscências e vivências, seu percurso acadêmico e profissional, com as suas “sortes e azares” pelo meio, que nunca dependem de nós; ficamos a saber muitas coisas, mas mesmo assim poucas, pois é uma rica vivência que quase parece que não foi aqui. 

Ficamos a conhecer Michel Flesch (…. qui m’a accueilli avec bienveillance, et soutenu mes pas de débutant dans le réseau français de coopération et d’action culturelle…), a saber de Jean-Claude Buyck (alors premier conseiller, nous avons travaillé en confiance et dans le respect des rôles de chacun...) e de Jacques Courbin (… qui a été de bref passage ici, et cependant décisif …). O anfitrião escutava atentamente, e como nós, veio a saber que ele foi « …celui qui a été le plus présent au centre culturel, et qui a montré le plus grand intérêt pour la société civile guinéenne, et singulièrement celle des artistes et des intellectuels qui ont une deuxième adresse à Praça, au CCFBG. … Leur soutien – et avec eux celui de tous les services de l’ambassade –, a été total, donc précieux… »
Por fim, exausto, sem querer, vai pouco a pouco, abrir-nos a alma do pauvrehomme Guillaume, que assim, sofrendo, entra pelas nossas almas adentro, sem pedir licença, cônscio que está que tem todas as licenças… “(…)Ma ami i ka so Blamensi i diretor di centru francis... Ami tambi i papé di dus mininu, 2 fidju brancu n’pelele ki misti presença di sê papépertu delis. (…)

As nossas almas, emperdinadas que são, habituadas a todos os sofrimentospossíveis numa existência, não deixam de se condoer com esta tirada que nos fala da realidade nossa que não lhe permite ficar, embora fosse o seu mais intimo desejo “(…) Enton, n’na baipaotru terra mas mindjorpaelis. Ku mas estabilidadi. Ma dantes, n’misti fala bosobrigadudifundudinhakorson. (…)”
Condoemos, mesmo que apenas por que também tivemos filha que não vimos crescer e que se um dia, como ele, nos tivessem dado a escolher, também teríamos ido para outra terra melhor para ela…

Assim embrenhado nos meus pensamentos, nos meus sofrimentos “possíveis numa existência” oiço-o a falar com carinho desta terra e povo. Mitiga a alma, ouvindo-o a citar nomes de pintores, compositores e poetas que trata respeitosa e carinhosamente de elefantes. Ao menos isso, na falta de tudo, de tudo o que perdemos, numa existência em que as perdas são maiores que a própria existência.
Por fim, o homenageado director do Centro Cultural, para controlar a emoção que se apodera de todos nós, toma a palavra ao pauvrehomme Guillaume e diz: “Vou terminar em português. Que é a língua de uma certa forma que me trouxe aqui, mesmo se, rapidamente, compreendi a importância do crioulo guineense.”

Na verdade não vai cumprir o prometido e terminará em crioulo. O Gui de Bolama, esse está quieto, sabe que nasceu a tão pouco tempo, que talvez não deva dizer nada. Afinal está em terras estranhas, em Bissau, numa localidade que nunca ouviu falar em Bolama, que se chama Penha, onde se situa esta imponente Embaixada. Como um heterônimo de Fernando Pessoa, navega em águas que não são suas; sim seguramente não são águas de Bolama. E como bom Guineense aproveita para misturar-se com os convidados, quer provar de tudo, acepipes franceses, tão raros em Bissau. Em Dacar sim, diz-se que eles estão em cada esquina, como os nossos "donetes" aqui. Mistura-se com os convidados e mistura as palavras do orador com o que sabe e não sabe, em suma o que imagina; e parado num grupo de artistas no meio da sala, diz deste seu heterônimo (pauvrehomme) Guillaume (que de todas as formas conhece melhor que nós), que aos quarenta anos, de potencial político, candidato a eleições, depois de ter sido chefe de Gabinete de um autarca e conhecer as lides políticas, resolve dar o mais ariscado passo da sua vida, abandonar tudo, a França eterna, a boêmia Montmartre, as cálidas águas de Côte D`Azur, as visitas semanais ao Louvre, os passeios dominicais nos Champs-Élysées, e ir atirar-se para o desconhecido; ir para um país, que os seus amigos nem conseguiam encontrar no Mapa-Mundo.

E eis que não acontece a agradável surpresa de ali vir a encontrar uma cidade chamada Bolama, onde um certo Francis Drake, tetravó dele passou um dia há mil anos a caminho do Brasil, e lá se apaixonar por uma índia, para - como o Pedro Álvares Cabral (segundo a Banda Eva?) - a levar numa caravela para as maravilhosas costas da Bretanha, a beber champagne na província de “La Champagne” (dizem que a índia fez um muxoxo quando provou mas depois adorou, naquele tal de “primeiro estranha-se, depois entranha-se”). Ali onde depois de muitos invernos frios e primaveras radiosas , das praias de Brest partiram (com uma revista de Astérix para ler pelo caminho) de volta as terras de Vera Cruz aonde viria ao mundo o nosso Guilherme. Guilherme? Quem é? Pergunta uma senhorita, desculpem, responde ele, gingando o corpo como só os marítimos fazem, é que Gui, em Bolama, é diminutivo de Guilherme… no Brasil tambem diz está, toda entendida.

É salvo in extremis pelo (pauvrehomme) Guillaume, que nesse momento tomando a palavra ao director , faz todo o mundo prestar atenção; tinha chegado a fase final do discurso, da conclusão. Na emoção do momento, esquece a promessa feita a Portugal, pelo director Thieriot, de terminar a oração com lusitanas estrofes, e deslembrando também da diplomacia, diz: Vou terminar como comecei. Dizendo simplesmente obrigado (di fundu di nha korson).

Bem, como “di fundu di nha korson…” parece mais com o crioulo do que com o português, tanto nos vocábulos como na beleza, por issso disse que acabou em crioulo. O Gui de Bolama, sem entender nada, olhou para o (pauvrehomme) Gullaume e deu os ombros; a este que aproximou-se interrogativamente, disse baixinho: “outra vez em crioulo…" este faz-se de desentendido e pergunta-lhe em português “o quê?” Este responde responde com dificuldade (estava deglutindo pela primeira vez na sua vida uma porção foi de repente regado com um fresco moetchandon) com a boca cheia: na kriol mas um bias dê!!!

O pauvrehomme Guillaume, sem saber o que dizer, partiu ao encontro dos convidados abraçando uns e outros, agradecendo, sabendo que, provavelmente, em breve todos eles serão espuma do tempo, recordações de um sultanato perdido na floresta, um Zamunda, algures na imensidão da Africa. E como um Príncipe Akeem, ao contrário, que não parte de Nova Iorque para África com a sua amada na garupa, mas apenas da Africa Atlântica para a África do Indico, que sendo uma mesma grande Africa é a única de todos nós, dele, de mim e de ti.

Ao lembrar disto, o pauvrehomme Guilaume volta para junto do Gui de Bolama, a tempo de servir-se do ultimo pastel da travessa, que esvaziando com atenção de não deixar desamparado, e lhe disse, fazendo “tchin-tchin” com ele: “você deturpou as minhas palavras, o que realmente disse, foi o seguinte: “… Dona dinha dona dinha dona, um alemao ku tchama Müller, ora ki baiba pa Brazil, i para ba na djiu di Bolama, nunde ki fika ba um bocadu k unha dona fémia dinha dona fémia dinha dona fémia, si kombossa, mamé dinha dona dinha dona dinha dona ki bai ba pa Brazil ku alemao ku tchama Müller.”


Bem, agora já não sei se o Gui di Bolama que ouviu mal ou se fui eu (eu estava naquela roda de artistas), mas como quem esta a escrever é que tem responsabilidades (acrescidas, como se diz por aqui) aceito que fui eu, na ânsia de escrever um texto bonito. “Bo obi diritu ?” bem estas ultimas palavras em crioulo são emprestadas ao Guillaume (pauvrehomme). 

domingo, 18 de agosto de 2013

O HOMEM QUE FOI UM CLAMOR

Arq. Fernando Teixeira 

“Guineenses bô temkuossa!”
Guillaume Thieriot , 26 de Julho de 2013

ALGO QUE FICOU, PASSANDO…
 Hoje, dia cinco de Agosto, o Sr. Guillaume Thieriot partiu de vez do nosso país. Possivelmente partiu alguns corações, provavelmente deixará saudades e algumas lágrimas recolhidas a pressa, como diria o poeta. Cinco dias antes, quarta-feira, 31 de Julho, na biblioteca do Centro Cultural Franco Guineense de Bissau, resolvi começar a escrever este texto sobre ele ainda “sob” ele, pois dentro de dias deixaria de ser o “nosso” Director, do “nosso” Centro Cultural Francês de Bissau. Escrever sobre ele, nessa sala de leitura, enquanto ainda era o director do Centro, mesmo que por apenas mais alguns dias, era uma espécie de solitária homenagem que lhes prestava. Uma homenagem, silenciosa e íntima (pois só conhecida por mim) ao homem simples mas especial que é Guillaume Thieriot.

Essa atitude, que agora na quietude desta outra sala, parece-me pueril, veio a ter outros significados que não apenas os que motivaram o meu objetivo inicial (escrever sobre as suas realizações, para que no futuro algo ficasse “escrito na pedra”, e não apenas nas recordações esparsas de cada um e apenas lembradas nas “passadas” futuras dos contemporâneos que com o tempo caem no esquecimento colectivo).

Não sei se a proximidade da separação pode não aguçar o engenho, mas repousa os sentires e permite um olhar, se não diferente, pelo menos mais equidistante e quiçá mais justo; mas também, pela frescura da memória, permite um contar mais autêntico. Devo escrever agora, nos ecos da despedida, na profusão das homenagens, todas merecidas, que este Senhor da Cultura teve, por ocasião da sua partida. Mas encontrar para esta minha, algo “mais”, algo de perene, algo que não se dissipa com as últimas bolhas da última garrafa de champagne.

Mas como abordar este homem social e culturalmente multifacetado de forma correta e autêntica, de modo a não influenciar o leitor com as nossas pretensas afinidades, criando uma simpatia artificial por uma personagem ideal (que não os há) que teria vivido entre nós numa determinada altura? Mas como uma homenagem é sempre uma homenagem, correremos sempre esse risco, mas quando não o ignorarmos, mas pelo contrário seja um dos pressupostos da nossa análise, em vez de um problema, torna-se uma mais-valia.

Não sei como “chegarei” ao Guillaume Thieriot, e como dali o levarei a vós, e se serei bem-sucedido, mas independentemente do que daqui “sair”, como esta é também a minha despedida, para elucidar os meus sentimentos, direi simplesmente como ele disse no seu discurso de despedida na embaixada de França “(…) Continuo até com muitas interrogações. Mas talvez um papel me venha, ou melhor dizer, não um papel, mas um líquido. Aquele líquido onde se mergulha um papel para revelar uma fotografia. (…)”

Estas frases, metafóricas, como ele as caracteriza, talvez me sirvam também nesta tentativa de “revelar” - mesmo que apenas um pouco, mesmo que apenas “a preto e branco”, na falta de um rolo colorido ainda - algo sobre ele, e principalmente sobre o seu legado, que ainda não foi dito ou apreendido. Por isso começo assim, sem pressas de mansinho, pois como disse o saudoso Amílcar Cabral “porque tenho pressa é que vou devagar”.

Mas quando numa compulsão quase Descartiana, decidi assim proceder, não esperava que essa inusitada decisão levar-me-ia tão profundamente ao meu passado; a recordar coisas que tinha sepultado, há muitos anos, naquele cemitério de recordações mortas, que carregamos toda a vida, mas onde cuidadosamente evitamos entrar; a lembrar coisas que não escrevi quando devia, no seu tempo, no calor dos acontecimentos, e hoje estou deveras arrependido. Por isso entendi que é este o momento de escrever sobre algo, feito de homens e actos, que mais do que passou… ficando, ficou passando. Pois se “nada acontece até ser contada” como disse Virgínia Woolf, aqui nestes tempos, algo “aconteceu” e mesmo que não fosse contada, mereceria sê-lo.

O INVENTOR DA CRIOLOFONIA
Em Bissau, nos tempos que correm, raramente nos aparecem individualidades tão marcantes, seres humanos tão relevantes, como ele, pela sólida cultura, pela competência e vontade de fazer, alem de uma enorme simpatia. Resumindo, o Guillaume Thieriot era um conhecido com quem poucas vezes (muito menos do que quereria) conversei sobre o nosso país, literatura, música, politica ou seja lá o que for, que obviamente eram do meu interesse, mas que também, pelos seus actos e realizações, notoriamente dele. Cruzávamos muitas vezes pelo all do Centro Cultural Francês. Encontrávamos nas vernissages, estreias de filmes, lançamento de livros, espetáculos musicais, seminários, encontros e outros eventos e cerimónias, que através da sua pessoa, o Centro realizava.

Há uns meses, num artigo, em que falava da “crioulofónia” - palavra patenteada por ele, que é o mais novo vocábulo da língua crioula -, (texto esse publicado na fecebook na página da “Terceira Via Guineense”), acabei falando deste senhor, nestes termos: “(…) Nas artes plásticas, na música, cinema e agora em prol da nossa língua nacional de comunicação, o seu legado é enorme e será certamente lembrado por muitos bons anos. Uma pessoa que por acaso do destino reúne num só individuo culturas diferentes como o Francês, o Brasileiro, o Guineense e seguramente outros que não sei. Cosmopolita por excelência, conhecedor da realidade Guineense, falante do Crioulo, amante da cultura Guineense, proporcionou-nos a todos durante estes últimos tempos um verdadeiro reencontro com a nossa própria cultura. Dele pode-se dizer, sem risco de errar, que “se mais não fez, mais não pôde.”

Estas palavras soam a um panegirico, mas não o são; são apenas uma constatação que centenas de pessoas podem repetir sem nenhum problema de erarem. Por isso falar dele, por quem já disse o anteriormente dito, não deveria ser difícil; era apenas, numa questão de justiça, baseando nesse texto, escrever por exemplo “tudo o que disse atrs é verdade, mas pequei por modéstia; é necessário dizer que tudo isso é verdadeiro, mas numa dimensão três vezes mais, etc., etc., ...”
Brincadeiras aparte (Guillaume gostava muito de brincar), mas na verdade, como o texto frisa, como “ser humano” , Guillaume Thieriot era “grande”; naquela acepção de grandeza que tem como base a “bondade de realizar” que uma vez frisei (sem ser entendido cabalmente) na caracterização da personalidade de Amílcar Cabral.

No dia da sua despedida na embaixada francesa, juntou, às três partes formais, constituintes de um discurso, três línguas dos presentes, mas não disse que falando em crioulo, português e francês, juntou estas três línguas a três outras dimensões de uma maneira magnífica: respeito por nós, falantes do crioulo, respeito pela língua do seu país, o francês e como não podia deixar de ser (sendo um diplomata) respeito pela língua oficial do nosso país. E isto não tem ligação com a “língua” mas com “dignidade”. Ou então não seria ele a dizer: « L’une de mes plus belles images au centre culturel, si je dois en garder une, cela aura été la clôture, la kabantada de la sumana di kriolofunia. Avec cette forêt aérienne de textes suspendus (…) cette littérature de corde, cette petite jungle de papier et de mots jetés en créole, et surtout tous ces visages heureux, tellement heureux, peut-être tout simplement de se voir reconnus dans leur dignité linguistique.

A maioria das pessoas tem dificuldade em respeitar algo, que sem ser abstracto, dificilmente é uma categoria mensurável ou mesmo “real” no seu pensamento, como a língua, embora a usem todos os momentos. Pois se o nosso respeito pela língua não tem a ver estritamente com a grandeza da “pátria” dessa língua, então vem do quê? Do respeito pela cultura (literária ou não) dessa pátria? Ou do respeito que temos pelos falantes dessa língua? Ou do respeito que temos por nós próprios, então que falantes dessa língua? Tudo isto não está ainda resolvido em mim.

Discuti estas categorias com o director Thieriot no seguimento de uma intervenção minha na comemoração de aniversário de um banco comercial, no Centro Cultural Francês, em que o chairman era ele. Nessa comemoração, a qui fiz menção atrás, critiquei o facto de um orador convidado falar em francês sem nenhum tradutor como se estivesse num país francófono. Mas pode ser que alguém pensou que era por não gostar de francês, mas falava apenas do respeito que os países e cidadãos de cada país devem ter uns pelos outros pertencendo ou não a uma organização transnacional. Sempre gostei da língua francesa de forma especial e tratei de a aprender nesse mesmo Centro cultural quando ainda no Liceu e depois da faculdade.

Mas criticando o facto do orador se ter exprimido na sua língua, “sem respeito” pelos falantes de português, não retirava o profundo respeito pela língua de Victor Hugo e Balzac, que adoro mais do que respeito a cultura francesa, por tudo que deu ao mundo. Entendo mesmo que nunca, no campo da cultura - se excetuarmos Hélade - outro país deu tanto ao mundo como a França. Quando digo “tudo” quero mesmo dizer “tudo”, no sentido que é tanto que nenhum outro vocábulo pode abarca-lo senão “tudo”. Mas também uso o “tudo” no sentido que “tudo” foi válido, mesmo o “terror” Jacobino da Revolução, que de uma forma enviesada, veio basear-se e legitimar-se na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão já proclamada.

Mas só volto a isto porque entendo que neste discurso de despedida – de que vos apresento fragmentos, para que possam entender quem foi o Guillaume Thieriot - ele, inadvertidamente, de certa maneira, dava respostas às minhas questões: “(…) Reconnaître une culture, reconnaître une langue, c’est reconnaître une personne, dans ses origines et donc dans son devenir, dans un même mouvement continu, des origines au devenir, comme celui qui va de la semence à la moisson. Entre les deux, c’est une affaire de confiance. Mais que l’on peut aider à gagner, par la reconnaissance d’un regard, d’une histoire, d’une langue… (…)"

Falei das línguas que Thieriot dominava, escrevendo nelas e comunicando com elas. Não sei se “pensava” nelas. Só falamos realmente uma língua quando “pensamos” nela antes de falar “com ela”. O crioulo tem um “problema” pois muitos seus falantes embora não “pensem com ela” , falam-na lindamente. por isso os suecos, espanhóis e outros falam-na lindamente e na perfeição, embora pensem primeiro na sua língua materna e depois traduzem para crioulo, com tanta rapidez que nem notam o que estão fazendo. Ele presta-se também a esta “rapidez”, pois pela sua natureza podemos traduzir palavra por palavra, sem ser preciso primeiro traduzir frases inteiras, como nas outras línguas.

No Guillaume, percebi que interiormente, consubstanciava-se a dimensão respeito por ele mesmo, o homem - sem ser o único que nessa sala falava essas três línguas - que tinha com cada uma delas uma relação particular que ultrapassava de longe a simples utilização que a maioria faz delas, simples ferramentas de comunicação. Mas sabemos que nunca é apenas um instrumento de comunicação e interação, porque cada povo é aquilo que é porque a sua língua é aquela que usa; e inversamente a língua de cada povo é “essa” e não outra porque é determinada pela idiossincrasia do povo que o cria todos os dias da sua existência. Embora isto é muito mais complexo do que estas duas linhas possam exprimir. Mas se basicamente o “falar” crioulo pressupõe a priori pensar “em crioulo” , e este assenta numa aculturação crioula, um sentir “crioulo” comum.

Não sei como era com Guillaume, se alguma vez pensou em crioulo, mas falava crioulo na perfeição e usava-a também com lisura. se “pensava em crioulo” antes de falar crioulo ou se traduzia do francês (ou português) , mas sei que “pensava no futuro e presente do crioulo”. Há dias vi escrito na porta da casa de banho do centro a seguinte frase: “kasa de banio i di nós tudo, pabiadikila, bu dibidiusal…”, bom nunca vi em nenhum outro sítio em Bissau, um tal uso do crioulo parecido. Se um homem é a língua que fala, então, tout court, Guillaume também era “o crioulo” que falava maravilhosamente bem; até com uma “perfeição gramatical” que acho surrealista. Basta ir ao Centro Cultural Francês ver os dizeres em crioulo que lá estão colados. Na verdade poderia chama-lo também, sem errar, de “o homem que foi a língua crioula” em analogia ao titulo deste texto.

Ordidja-notanto

Continua...

quinta-feira, 8 de agosto de 2013

O TRANSEUNTE QUE AO INÍCIO DA NOITE...

Geraldo Martins

Em homenagem aos 20 anos do restaurante D. Fernanda

O transeunte que ao início da noite tivesse tomado a estrada de Santa Luzia que desce da Fortaleza da Amura, junto à foz do Geba, ao Quartel General, e que, à altura do antigo restaurante Casa Santos, tivesse feito um detour à direita, teria entrado numa ruela estreita ladeada de casas sóbrias ao fundo da qual teria visto uma dezena de viaturas estacionadas ao lado de uma vistosa vivenda. E se, por curiosidade, tivesse entrado naquela vivenda pelo portão metálico lateral que dá acesso ao quintal, ter-se-ia encontrado num restaurante caseiro mundialmente conhecido.

De cada vez que o enorme Antonov da força aérea Angolana aterrava no aeroporto de Bissau em missão de apoio logístico à Missang, vinha com uma dúzia de marmitas que eram levadas àquele restaurante e enchidas de comida que era depois transportada de volta para ser comida em Luanda no dia seguinte.

A fama do restaurante em Luanda nascera da sua frequência por clientes Angolanos célebres. João Miranda não só apreciava a culinária soberbamente requintada como também admirava-se como ambiente acolhedor. Georges Chicote uma vez jantou alí com a esposa, a qual pediu que lhe oferecessem as lindas plantas que decoram o interior do restaurante como lembrança da mais perfeita combinação entre a beleza e o bom gosto. A selecção de futebol de Angola também alí jantou e os jogadores, fazendo jus à veia festiva dos Angolanos, após o jantar derraparam numa interminável festa, com danças kuduro. De vez em quando, o Manucho lá ia espreitar a dona do restaurante na cozinha, dizendo-lhe:
–  Tia, sabe, em toda a minha vida, nunca comi peixe e frutos do mar tão saborosos assim!
–  Tia, tá a perder dinheiro, porque não vem instalar-se em Luanda?

O restaurante foi criado em 1993 por uma senhora cujo nome é de uma grandeza tal que não cabe numa folha de papel. Começou no quintal de uma pequena casa alugada. Alguns anos mais tarde, a dona construiu a sua própria casa, uma aprimorada vivenda, com os rendimentos do próprio negócio, e transferiu para alí o restaurante. Desde o início, a especialidade foi sempre a mesma: peixe grelhado, espetadas de carne grelhada, frango à cafriela e saladas à moda da casa. Desde então, o desfile de clientes seduzidos pelo sabor peculiar daquela culinária típica nunca mais parou.

Em 1995, os peritos Africanos do Banco Central dos Estados da África Ocidental (BCEAO) que vieram instalar a filial do banco em Bissau fizeram despedidas emocionantes no restaurante, no final de suas missões, levando consigo marmitas de comida para o Senegal, Burkina Fasso, Cote d’Ivoire e Benin.
–  Vá lá saber-se se, com amostras, as nossas esposas aprendem a fazer igual a isto – diziam com um ligeiro sorriso nos lábios.

As esposas não vão aprender com certeza. Ninguém aprende a fazer aquelas saladas de tomate e alface. Aquilo é um mistério, algo vistoso e extremamente delicioso que quase se tornou numa lenda.
Philip Dacoury Tabley,ex-governador do BECEAO em Dakar, sempre que visitava Bissau, não prescindiadaquele grelhado à mistura com salada.
– Ah, a salada!,  dizia, quando lhe punham à frente o delicioso prato.

Certa vez, um cliente Português, sempre impressionado com a famosa salada, perguntou à proprietária do restaurante qual era o segredo. Ao que esta respondeu espontaneamente:
– O segredo está nos ‘tomates’.

Instantes depois, a resposta deu lugar a uma hilariante gargalhada à volta da mesa, quando as cabeças dos homens, sempre prontas a jogos perversos, deram largas à livre interpretação da frase...

Quem é esta senhora que muitos já convidaram a ir montar o negócio nos seus prórpios países; que recebe regularmente no seu restaurante visitas de ilustríssimos clientes como o Bispo de Bissau, D. José Camnaté Na Bissign; que o Ramos Horta, quando ainda Ministro dos Negócios Estrangeiros, convidara a ir a Dili montar um restaurante e formar Timorenses; e que, jura agora o Representante Especial do Secretário Geral das Nações Unidas, vai levá-la a Dili como quer que seja, quando terminar a sua missão na Guiné-Bissau?

Conheci-a noínicio dos anos 90. Numa outra vida ela era Secretária de Direcção, uma das melhores  que já conheci. Um dia dei-lhe um texto meu para bater à máquina, e fiquei espantado quando vi a rapidez com que batia  enquanto me olhava nos olhos e falava comigo. Quando deixou a profissão entrou no mundo de negócios e, com o tempo, a sua garra de batalhadora catapultou-a para o patamar do sucesso.

Mulher carismática, de grande carácter e de muita fé, nunca desistiu de lutar e de ir atrás do que quer, apesar das contrariedades da vida. Durante anos foi uma empreendedora incansável.Vendeu srovetes, gelados e bolos, dedicou-se ao comércio, importou e vendeu vinho e cerveja, e desenvolveu vários outros negócios.

Em 2000, no meio de  uma grave crise de energia eléctrica em Bissau, instalou no seu bairro um gerador que fornecia electricidade a uma boa parte do bairro através de contratos de partilha de custos.Actualmente, com quatro grupos instalados em várias partes da cidade, fornece energia eléctica a cerca de duzentas habitações.

Mas, de entre os seus vários talentos, é seguramente a culinária, uma arte tão ancestral como a própria civilização, que a projectou definitivamente como um monumento da cozinha típica Guineense  e, incontestavelmente, como património nacional. O nome dela é Fernanda Gomes Fuma. Aliás, DONA FERNANDA!!!

DONA FERNANDA

segunda-feira, 5 de agosto de 2013

Cerimônia fúnebre

Hélder Pereira Saldanha
Em nome de toda à família, aproveito a oportunidade para agradecer a sentida reação de condolência e solidariedade de tod@s @s  amig@s que reagiram a notícia do falecimento do Hélder Saldanha.

É reconfortante ter amigos como vocês neste momento de dor e perda e puder confirmar através do vosso gesto o quanto Hélder Saldanha era querido por todos.


Informo ainda que o velório com corpo presente está marcado para amanha terça-feira 6 de Agosto na Igreja de Massamá e o funeral  será na tarde de quarta-feira dia 7 de Agosto, no Cemitério de Benfica.    

sexta-feira, 2 de agosto de 2013

Até Sempre Companheiro...


Hélder Vaz
Por: Hélder Vaz

Conhecemos-nos na escola primária, onde, sendo homónimos, partilhamos sempre a mesma carteira, até à 4ª classe. Fomos sempre mais do que colegas. Fomos muito amigos e irmãos.

Por isso, ao regressar à Guiné-Bissau, em 1992 , para me dedicar exclusivamente à acçao política, e estando o Hélder a lecionar na Escola de Péré, eu fui convida-lo para chefiar o meu gabinete no partido. E assim ficamos, lado a lado, mano a mano, lutando, até eu ter constatado e declarado, em Maio de 2004, que não existiam condições objectivas para se exercer atividade política com seriedade, partindo para um longo exílio voluntário. Só então nos apartámos. O Hélder significava para mim, o meu "alter-ego". A minha presença era dispensável quando o Hélder estava presente. Nós não necessitávamos de usar palavras para falarmos um com o outro. Aqueles olhos eloquentes do Hélder diziam tudo, sem ele ter necessidade de usar a voz. Fomos sempre cúmplices desde meninos .

O Hélder Saldanha, sempre calmo, calado, matreiro e gozão, e eu sempre irrequieto, falador e brincalhão. Eramos duas faces da mesma moeda. Sem ele a minha vida sofrerá um vazio enorme, porque não creio que vá encontrar tao cedo quem me entenda sem necessitar de palavras , como o Hélder . O Hélder era a eficácia discreta. E quanto ele merecia ser parte , sempre discreta , deste esforço titânico em que voltamos a estar empenhados, de alma e coração. Eu estou a imaginar quanto ele amaria participar na organização desta campanha em preparação; como ele iria , calmamente , organizar a logística nas regiões e setores; como ele manteria a calma olímpica , que o caracteriza, perante a azáfama dos militantes em polvorosa.

Eu sabia que com o Saldanha não haveria agitação e as missões seriam sempre cumpridas com rigor. A partida prematura deste meu irmão, camarada, amigo e cúmplice das brincadeiras de criança, deixa a minha alma e a minha vida definitivamente mais pobres. Que Deus lhe conceda Eterno Descanso, em Paz e com a Alegria de ver Triunfar a Causa e os Ideais pelos quais ele lutou com denodo e paixão. Até Sempre , meu Eterno e Muito Fiel Amigo. Nós, os teus , nunca mi te esqueceremos e recordar-te-emos com o Orgulho de termos partilhado a tua amizade. Com dor de te saber longe, ter-te-ei no coração aqui perto. Que Deus te acolhe e conforte em Seu Regaço de Luz. Até Sempre Companheiro.

                                                                Hélder Saldanha
Nota de Rodapé


Tomei liberdade de publicar este belo texto do mais-velho e tio Hélder Vaz, num testemunho sentido, devido ao falecimento do homônimo (chara para os leitor@s brasileiros) Hélder Saldanha. Emocionado, não me atrevo a alongar com mais palavras. Peace!!!